sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

A obra-prima Watchmen

"Diário de Rorschach - 12 de outubro de 1985.
Carcaça de um cão morto no beco hoje de manhã com marcas de pneu no ventre rasgado. A cidade tem medo de mim. Eu vi sua verdadeira face. As ruas são sarjetas dilatadas cheias de sangue e, quando os bueiros transbordarem, todos os vermes vão se afogar. A imundice de todo sexo e matanças vai espumar até a cintura e as putas e os políticos vão olhar para cima gritando "salve-nos"... e eu vou olhar para baixo e dizer "não". Eles tiveram escolha, todos. Podiam ter seguido os passos de homens honrados como meu pai ou o presidente Truman. Homens decentes, que acreditavam no suor do trabalho honesto. Mas seguiram os excrementos de devassos e comunistas sem perceber que a trilha levava a um precipício até ser tarde demais. E não me digam que não tiveram escolha. Agora o mundo todo está na beira do abismo contemplando o inferno e os liberais, intelectuais e sedutores de fala macia... de repente não sabem mais o que dizer."
O texto acima foi retirado do "diário do Rorschach" logo nas primeiras páginas de Watchmen, uma das obras primas de Alan Moore. Denso não? Bom, é este o ritmo de toda a narrativa. Para quem absorve é de se ficar semanas abalado com o conteúdo desta "estória de super-heróis".
Li três vezes Watchmen e em todas elas descobria coisas novas sobre a trama. A HQ tem tantas referências sobre assuntos históricos, filosóficos, políticos e científicos que é impossível em uma leitura superficial digerir completamente a narrativa. "O Conto do Cargueiro Negro" (HQ lida dentro da HQ) é um exemplo. Precisei de duas leituras para entender seu significado.
Toda essa bomba de informações é emaranhada de forma tão espetacular dentro do roteiro que, dispersados, é irracional a relação dos assuntos. Vão de extraterrestres, vigilantes, sociopatas e mutantes nucleares passando por conflitos sociais, mega corporações, tensão pré-guerra até romances e dramas de aposentados. Moore, dentro de uma trama frenética carregada, consegue contar a história de cada personagem central, consegue mostrar-nos o que move cada um e quais seus traumas e desejos. Não é a toa que esta simples história em quadrinhos é referência em leitura, seu desenrolar está à beira da perfeição... "e de repente os críticos das artes seqüenciais como obras intelectuais não sabem mais o que dizer".
Alguns dos diálogos que julgo mais interessantes são entre Rorschach e seu psicanalista. Onde o primeiro fala ao segundo sua visão da sociedade e porque se tornou um vigilante violento. É observável neste colóquio a desconstrução de um ponto de vista, no caso o do psicanalista, que acaba enxergando que a vida não é a maravilha que pensava ser. É com essa visão que saímos ao terminar de ler Watchmen. Deixa-nos um gosto amargo na boca, uma sensação de improfícuo. E, talvez, essa sensação faça com que mudemos nossos conceitos e, como fez o psicanalista, importemo-nos um pouco mais com o mundo.

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Uma leitura essencial e recomendadíssima. Como é custoso, em tempo e dinheiro, para se adquirir o livro. Recomendo o download na net mesmo. A qualidade é boa, principalmente em pdf.

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Recentemente Watchmen foi adaptado para as telonas. Infelizmente o filme não é tão impressionante como a obra escrita, mas também não é ruim. O defeito é que para quem não leu a HQ, é difícil compreender o desenrolar do filme e para quem leu, o filme parece estar incompleto. No entanto, só o fato de ver nossos "heróis" em ação já é de ficar arrepiado (LOL). Rorschach foi muito bem adaptado (a voz é fera - "help us" "no"), mas senti falta da profundidade do psicanalista descrita acima, no filme não tem( =( ).

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Algumas observações e personagens:

Cenário: Passa-se no EUA, principalmente em NY, no período da guerra fria. Porém Nixon ainda é presidente, houve vigilantismo (heróis mascarados), Doutor Manhatam (um acidente nuclear) fez vários avanços tecnológicos, um interessante é o carro elétrico.

Lei Keene: Importantíssima na estória. É a lei que baniu o "vigilantismo" nos EUA depois de uma greve policial. Os únicos ex-vigilantes na ativa são Manhattan e Comediante - autorizados pelo governo - e Rorschach - ilegalmente.

Rorschach: Falei pouco dele né, rs. Rorschach é um vigilante sociopata traumatizado. Sua visão de justiça é aterradora, porém compreensível. O nome Rorschach é por sua mascara que lembra o "teste de Rorschach".

Dr. Manhattan: Uma vítima de um acidente nuclear que adquiriu super-poderes, é o único que tem super-poderes na estória. Tanto poderoso é, que está perdendo seus sentimentos em relação à humanidade. O nome Dr. Manhattan é devido aos testes atômicos que geraram a bomba atômica nominados "Projeto Manhattan".

Ozymandias: Diz-se o homem mais inteligente da terra e capaz de parar uma bala. Um dos pontos centrais da trama. Maquiavélico e calculista. Ozymandias era também o apelido do faraó Ramsés II.

Comediante: Frio, arrogante, sarcástico e realista. Personagem interessante. Lembra o Coringa, mas é um pouco mais prepotente e arrogante.

Bom, o resto é com você. Baixe a HQ e deslumbre esta obra prima!

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

O sapo, a panela, o terremoto e o Haiti


Diversas vezes assisti o documentário "Uma verdade inconveniente" de Al GoreCada vez que o fazia, possuía novas perspectivas, e acabava por analisar pontos diferentes no filme o que me causava uma metamorfose de opiniões. Em paralelo, a historieta do Sapo na Panela era algo que imutavelmente me chamava à atenção neste filme:

- Um sapo pula dentro de uma panela de água fervendo. Ele pula pra fora imediatamente, pois a súbita mudança de temperatura o causa um choque.
- Mas se o sapo pular na água morna e a água ir esquentando aos poucos, ele não sentirá a mudança, não sairá da água e por fim morrerá.

Notaram a semelhança com o comportamento humano? Nós, a sociedade de prepotentes racionais, quando temos algum choque, uma catástrofe natural ou um atentado terrorista por exemploprontamente buscamos remediar a situação. Tomamos as medidas necessárias até que o problema, enfim, esteja esquecido resolvido. Já se o problema é inserido em doses homeopáticas vamos adaptando-nos a ele, até que não pareça mais um problema, pareça apenas uma dura indiferente irremediável realidade cotidiana.


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O Haiti... a o Haiti, um dia chamado de "a jóia das Antilhas" tanto produtivo que era. Produtivo e usurpado pelos franceses, seus colonizadores, a um ponto que, para se ter uma idéia, 50% do PIB francês da época era provido desta colônia centro-americana. Mas essa mamata um dia teria que acabar. E acabou! Poucos anos após a abolição da escravatura, adquirida com luta, em 1803 finalmente o Haiti declarou-se independente. E declarou também, sem perceber, o suicídio econômico.
Como a grande maioria dos países da época era escravista, o Haiti, sendo temido por ser o primeiro país americano livre da escravatura, foi boicotado comercialmente durante 60 anos, o que rendeu uma grande miséria. Se isso não bastasse, anos depois, a França cobrara uma dívida referente à indenização para com os ex-donos de terras e escravos haitianos. O juro interminável desta dívida que fora paga durante 80 anos drenara ainda mais a ínfima economia do país.

Que o Haiti precisou e ainda precisa de ajuda é de indubitável certeza. Os países que o cercam ao redor do globo, mesmo depois do fim do bloqueio comercial, pouco fizeram para ajudá-lo. O EUA ocupou-o militarmente no início do século XX, única e exclusivamente para defender seus interesses no território. Durante a guerra fria apoiaram um líder conhecido como Papa Doc, o qual com uma feroz e violenta ditadura comandou o Haiti até a década de 70 quando morreu e deixou o governo nas mãos de seu filho, Baby Doc. E dá-lhe mais ditadura e violência.

Com um passado de assassinatos e deposições políticas, finalmente em 2004, com um pedido do interino no governo, Bonifácio Alexandre, o Haiti requisitou a assistência da ONU. Esta, que ainda não havia feito nada em prol do miserável país, enviou uma tropa de 6.700 homens na missão de paz MINUSTAH, comandada pelo Brasil e que perdura até os dias de hoje.


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Retirado de Wikipédia

Em 12 de janeiro de 2010, um terremoto de proporções catastróficas, com magnitude 7.0 na escala de Richter, atingiu o país a aproximadamente 22 quilômetros da capital, Porto Príncipe. Em seguida, foram sentidos na área múltiplos tremores com magnitude em torno de 5.9 graus. O palácio presidencial, várias escolas, hospitais e outras construções ficaram destruídos após o terremoto, estima-se que 80% das construções de Porto Príncipe foram destruídas ou seriamente danificadas. O número de mortos não é conhecido com precisão, embora fontes noticiosas afirmem que pode chegar aos 200 mil, e o número de desabrigados pode chegar aos três milhões. Diversos países disponibilizaram recursos em dinheiro para amenizar o sofrimento do país mais pobre do continente americano.


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Ficou clara a correlação entre os títulos? O terremoto 7.0 que atingiu o Haiti é como a panela com água fervendo que, devido ao choque, faz com que o sapo tenha uma pronta resposta. Já a historia haitiana é como a panela com água que ferve aos poucos e que o sapo não dá a devida importância, acostuma-se com o aumento da temperatura, e por fim, morre.
Neste instante todo o mundo está contemplando o horror haitiano. Sentindo muito pelos milhares de pessoas mortas no sismo.
Bom, se analisarmos, foram milhões as pessoas mortas pela desnutrição, pela miséria e pela violência ao longo da história haitiana. Bem mais que as mortas no terremoto. Se este terremoto foi considerado pela ONU a maior catástrofe natural desde o seu surgimento, o Haiti é uma das maiores catástrofes sociais da história.
A verdade, nua e crua, é que pouco nos lixamos para o Haiti, como pouco nos lixamos para a África, como pouco nos lixamos para qualquer que seja o necessitado sem laços familiares. A lei de talião é da natureza humana. Se pudéssemos escolher entre o mínimo necessário para todos ou o máximo possível para nós mesmos, não hesitaríamos na seleção da segunda alternativa. Se a ajuda que está chegando agora dos países ricos para a reconstrução do país houvesse vindo a anos atrás, talvez o Haiti nem precisaria mais de ajuda. Mas não o fizeram antes porque não enxergavam algo “tão pequeno” quanto a miséria da população, não o fizeram por preguiça.
O sapo aos poucos pula fora da panela com água fervendo do terremoto no Haiti. Mas infelizmente está dormindo em uma panela com uma água que apenas esquenta a cada dia, uma panela bem maior e mais perigosa que a do terremoto, a panela chamada egoísmo.






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Último discurso de doutora Zilda Anrs, uma das poucas que realmente se importavam com o próximo.




referências:



Uma verdade inconvenienteAn Inconvenient Truth , EUA2006 - 100 min - Documentário


Pesquisas sobre Haiti: Wikipédia e Blog Mirian Leitão


Lei de Talião - "Olho por olho, dente por dente"



quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Faíscas entre EUA e China

O artigo abaixo refere-se a inevitável disputa política-econômica EUA x China. Ocupando as posições das duas mais prósperas economias mundiais, o poder destes países é grande em demasia para uma colaboração aprofundada entre ambos. As medidas para a aceleração de crescimento de uma diretamente afeta o crescimento da outra.
Até provar-se o contrário, a rivalidade entre estes dois gigantes é uma ótima oportunidade para o Brasil. Rivalidade é sinônimo de concorrência, e para um fornecedor é sempre bom uma maior cartela de grandes clientes. (veja aqui opinião do parceiro ECAPO sobre o paradigma).

Segue artigo:
Retirado de BusinessWeek

Os laços entre EUA e China provavelmente vão se deteriorar este ano com o aumento das tensões comerciais entre os dois países, o que representa o maior risco geopolítico deste ano, de acordo com um relatório elaborado por um grupo de consultoria de risco político. “Apesar de o fato de que tanto o presidente Obama e o presidente Hu Jintao na China desejarem ter um bom relacionamento, os indicadores subliminares são de que essa relação está se dirigindo para águas mais perigosas”, disse David Gordon, diretor de pesquisa do Eurasia Group de Nova York e ex-chefe de planejamento de políticas do Departamento de Estado no governo do presidente George W. Bush, em uma entrevista para o canal de televisão Bloomberg. Com eleições para o Congresso em novembro e continuidade da elevada taxa de desemprego nos EUA, a política da China de atrelar o yuan ao dólar ficou sob críticas crescentes, disse Gordon. “Desde que você tem um crescimento de 10% na China e 10% de desemprego nos Estados Unidos e eleições chegando em médio prazo, isso é um mau presságio para as relações EUA-China”, disse. Outros grandes riscos globais em 2010 incluem um regime cada vez mais instável no Irã e divergências políticas fiscais na Europa, disse o grupo em relatório.